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OPINIÃO: Às favas com os fatos, eles querem os mitos

O Gladiador é um filme dirigido por Ridley Scott e lançado no ano 2000, que narra a história de um general romano chamado Maximus Meridius. No filme, Maximus, por suas habilidades militares e virtudes morais, figurava como um dos preferidos do Imperador Marcus Aurelius, que, inclusive, cogitava seu nome para sucedê-lo como supremo chefe de Roma.

No entanto, o general acaba traído por Commodus, o corrupto filho de Marcus Aurelius, que, enciumado, mata o próprio pai, assume o posto de Imperador e determina a morte de Maximus, que escapa da execução, se torna gladiador e, ao final, numa reviravolta emocionante, acaba matando Commodus em duelo sob os olhares de todo o povo de Roma.

Uma história interessante, mas que não passa de balela das grossas. Maximus Meridius nunca existiu de fato. Marcus Aurelius existiu, foi Imperador, mas nunca cogitou passar o Império para outro que não seu filho Commodus, que também existiu e, de fato, foi um Imperador inábil e corrupto, mas não matou seu pai, nem foi morto por nenhum general virtuoso. Foi enforcado por seu serviçal, Narcisus, durante o banho, numa conspiração de um Senado possivelmente tão canalha quanto ele.

Mas tudo bem, cinema é arte e a arte convive bem com a fantasia. A história real, às vezes, é complexa e nem sempre excitante o suficiente para chamar atenção. Para dar mais dramaticidade ao enredo, fatos foram simplificados e misturados com ficção numa estratégia que deu muito certo. O filme empolgou público e crítica, ganhou Oscars e foi um enorme sucesso de bilheteria. Exponho agora o meu medo: a prática de subverter a história para emocionar o público parece ser cada vez mais transposta da arte para a política. Nos discursos de alguns presidenciáveis, estatísticas são alteradas, fatos são forjados, inimigos são inventados e até trechos da Bíblia deturpados para incutir no eleitor uma emoção não condizente com a sobriedade da razão, esta sim, essencial ao processo político.

Pior, para meu desespero, vejo eleitores ansiosos por mandar às favas os fatos e a razão, como crianças que se recusam a entender que Papai Noel não existe. Para esses, qualquer movimento no sentido de desmentir inverdades ou esclarecer equívocos soa como heresia conspiracionista a ser combatida com urros e palavras de ordem. Tal fenômeno não é exclusividade brasileira. Nos Estados Unidos, o Washington Post contabilizou 1950 mentiras contadas por Donald Trump em apenas um ano de governo, sem que isso fosse capaz de sequer constranger seus apoiadores, que, como aqui, insistem em se empolgar com "verdades" escolhidas a dedo, de acordo com sua vil conveniência. Acreditar em bravatas às vezes é contingência, mas às vezes é opção, uma opção cômoda, infantil e pusilânime. Nesse contexto em que lorotas circulam impunes e influenciam pessoas, uma verdade aparece como essencial: a de que uma parcela significativa do eleitorado pouco se importa com os fatos, eles querem mesmo é viver de mitos.

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